Escrevi este texto antes das passeata do dia 20, aquela com 100.000 pessoas no Rio. Tratei da necessidade tamparem os rostos. Referia-me aos revolucionários que lutam por um país melhor nesta América portuguesa coberta de ditaduras em sua história. Não tratava, portanto, nem de aproveitadores e muitos menos de agentes infiltrados que se aproveitam para tornar tudo mais caótica com a finalidade de criminalizar os movimentos sociais.
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Eu, muitos de minha geração e das gerações anteriores participamos de muitos atos de protestos contra a ditadura empresarial-militar instalada no Brasil pós-1964. Fizemos panfletagens, atos-relâmpagos, passeatas, comícios, debates e piadas. Escrevemos nos muros pela liberdade e dizeres contra os ditadores eleitos ou não em nosso país- não custa lembrar que uma das manobras de nossa ditadura era disfarçar com o voto as atrocidades que ocorriam nos porões dos órgãos de repressão da polícia política e dos quartéis militares. E esta mesma ditadura, é claro, eram apoiada por parte da classe média e, principalmente, por empresários que tinham influências no governo. Muitos, inclusive, patrocinaram a repressão e seus órgãos de torturas. E por quê?
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Eu, muitos de minha geração e das gerações anteriores participamos de muitos atos de protestos contra a ditadura empresarial-militar instalada no Brasil pós-1964. Fizemos panfletagens, atos-relâmpagos, passeatas, comícios, debates e piadas. Escrevemos nos muros pela liberdade e dizeres contra os ditadores eleitos ou não em nosso país- não custa lembrar que uma das manobras de nossa ditadura era disfarçar com o voto as atrocidades que ocorriam nos porões dos órgãos de repressão da polícia política e dos quartéis militares. E esta mesma ditadura, é claro, eram apoiada por parte da classe média e, principalmente, por empresários que tinham influências no governo. Muitos, inclusive, patrocinaram a repressão e seus órgãos de torturas. E por quê?
A ditadura, como a atual democracia
brasileira, favorecia o empresariado, em especial algumas frações deste grupo
que domina nossa sociedade . O setor financeiro tomou a ponta do processo de
acumulação, mas também as empreiteiras ganharam com obras faraônicas, como a inútil
estrada que cortava a Amazônia e foi retomada pela floresta. A crise da nossa
dívida levou mais tarde ao rompimento dos setores empresariais e também ajudou
a impulsionar os trabalhadores e jovens a caminharem pelas ruas do país
gritando e cantando frases como estas: “Fora daqui o FMI!”, “Abaixo a ditadura!”,
“Anistia!”, “Diretas, Já!”, “Vai acabar/ O quê?/ A ditadura militar/ Oba!” e
muito mais.
Tivemos, os estudantes da UFRJ, a
coragem de panfletar (o que obviamente era proibido) na entrada da Central do
Brasil, ali bem do lado do Ministério do Exército, sobre um ato que ocorreria
no dia 31 de março de 1986 (ou seria 1987? Ah, a memória!), ou seja, o enterro
da ditadura militar. Era um ato com a alegria jovem cantando em ritmo de marcha
fúnebre os versos “o povo não quer mais/ a opressão dos generais/ o povo não
atura/ esta tal ditadura”. Esta alegria contratava com a tristeza dos
enamorados da doente terminal, a ditadura, que ainda
assim coagia o Congresso Nacional e sua liderança burguesa a fim de limitar a
nossa luta por uma transição democrática mais veloz e profunda. E até
que os enamorados conseguiram com suas orações e ameaças limitarem os avanços
democráticos dos que iam para as ruas procurando nos becos a tal democracia. Lembro-me
de como éramos vivos e saudáveis neste dia em que a panfletagem foi feita, neste
dia em que os da caserna já haviam deixados de bater no peito o orgulho sentido
de serem realmente ditadores com o disfarce do voto.
Voltemos ainda ao ato para pensarmos
sobre os que caminham hoje pelas ruas de nossas metrópoles. Fizemos a
panfletagem lá na Central do Brasil, mas é claro que fizemos com muita rapidez
e medo, pois não queríamos conhecer os porões de nenhum quartel ou coisa
parecida. Nossos jovens que hoje protestam fazem bem em esconder suas faces. Os
ditadores arquivam imagens e os que foram torturados na época sabem bem disto.
Na década de 1980, aumentamos os atos contra a ditadura e passamos a produzir
organizações populares que hoje são as bases da nossa democracia precária: sindicatos,
movimento rurais, órgão de denúncias de torturas e torturadores, partidos,
centrais sindicais. Decadente, ou fingindo-se de morta, a ditadura e seus
órgãos de repressão deixaram de reprimir com o mesmo rigor e violência (esta
que estamos vendo com mais clareza nos últimos dias em nossas ruas). Deixaram naquele momento de reprimir e isto talvez
porque fosse impossível travar o crescimento quantitativo de pessoas que
passaram a protestar. O crescimento trouxe para os atos até os antigos
apoiadores da ditadura.
Hoje, nos campos e cidades, nas ruas
e nos locais de trabalho, vemos cada vez mais se ampliar o número de protestos
e de quem se põe a protestar. Aqueles que defendem o status quo (econômico, político e social) rapidamente se
expressaram contra os manifestantes. Os órgãos de repressão foram acionados com
toda a sua intolerância e brutalidade. Filetes de sangue passaram a escorrer
dos rostos jovens que se propuseram a defender uma das facetas da democracia: o
direito de protesto. A democracia sempre esconde a sua faceta ditatorial até
que a população perceba o mundo em que vive e tenha a coragem de mostrar a sua
face indignada com a relação promiscua entre o Estado e o capital. Em nosso
país, cada vez mais tomado por obras faraônicas financiadas pelo Estado para
depois ser entregue a empresários-como é o caso do emblemático estádio
Maracanã-, o lucro de uns chegam a bilhões enquanto alguns precisam ser
consolados com bolsas do governo para poderem se alimentar. E sabemos que o
consolo é um ato antirrevolucionário se não acompanhado da organização popular
livre e independente do Estado.
Duas personagens me ocorrem neste
momento: um é o morto-vivo de vários filmes de terror. Nossa ditadura não se
transformou em democracia. Nós calamos os ditadores, que, vira e mexe, vem nos
aterrorizar dizendo que a ditadura foi um mal necessário com suas torturas,
assassinatos. Agora o morto-vivo usa balas de borrachas e gás de pimenta no
olho do povo diante dos holofotes das câmeras de televisão. Usam ainda mais da
burrice se mostrando tentados a prender quem usa vinagre para se proteger do
mesmo gás. A ditadura é um morto-vivo a caminhar pelas ruas e campos do Brasil
assustando a todos.
Outra personagem que me ocorre é Gulliver
quando na terra dos anões. Estes o amarraram ainda adormecido. Estes
acreditavam terem forças suficientes para coagir o que para eles seria um
gigante. Sim, os ditadores são
normalmente anões com medos de Gulliver. Este talvez descubra seu tamanho
nessas passeatas contra o aumento da passagem e contra a entrega de nosso
patrimônio à meia dúzia de empresários ligados à FIFA e aos governos
brasileiros. Como na ficção, talvez o Gulliver, que passou a caminhar fazendo
passeatas por nossas ruas e portas de estádios, consiga se impor, se
desamarrar. O gigante se mexe e parece estar acordando.
ontem eram os jovens contra a ditadura,
hoje testam a democracia e encontram reflexos daquela
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