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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Luta de Classes Na Grécia Hoje: É O Velho Capitalismo

"Lutar/ Quando é fácil ceder/ Vencer o inimigo invencível/ Negar quando a regra é vender." (Chico Buarque)

Liguei hoje à noite a televisão, pois queria saber o que o parlamento grego tinha decidido na votação que está inflamando ainda mais o povo grego. Liguei para ver o que os telejornais tinham a dizer para tentar nos formar (não informar, visto que não é esta a função das televisões), ou seja, para tentar nos convencer de que suas opiniões são ou as únicas ou as verdadeiras. Na Globo News ouvi dizer que ocorrera a aprovação e que diversas pessoas "violentas" (palavra da correspondente do sistema Globo) se recusavam a aceitar a decisão. Disse a repórter: "A polícia está lançando muita bomba de efeito moral... é a única maneira que ela vê para conter a ação dessas pessoas violentas.".

Há de se perguntar: O que é a violência? De onde surge? Quem a produz? É do dramaturgo alemão Bertolt Brecht uma frase famosa que nos ajuda a repensar esta questão. Disse ele: "Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem." Poderíamos perguntar a tal repórter quem começou a violência na Grécia: O rio que tudo arrasta ("essas pessoas violentas" que protestavam contra a possibilidade de ficarem sem emprego e, portanto, sem ter a sua sobrevivência assegurada) ou as margens que o comprimem (a violência capitalista que produziu os FMIs, insegurança financeira, Estados polícias...)? É bem possível que a resposta já esteja na própria fala da repórter e nas interpretações dadas pela empresa para a qual trabalha. Qualquer análise simples de sua fala deixa bem claro qual é a sua posição. O seu ponto de vista é o da polícia, isto é, da parte repressora do Estado grego. Ou não seria isto que quer dizer a frase "é a única maneira que ela (a polícia) vê para conter as ações dessas pessoas"? É claro que colocar um ponto de vista sem colocar o outro já é ser tendencioso, ainda mais quando se usa o adjetivo "violentas" para qualificar as pessoas que não concordam com o ponto de vista apresentado.

Qualquer leitura de qualquer jornaleco nos informa que na Grécia está previsto demissões, cortes de gastos públicos, aumentos de impostos e privatizações. Tudo isto para receber uma parcela de 12 bilhões de euros como ajuda "oferecida" pelo FMI e pela União Européia, mas que em troca exigem um corte de despesas para se poupar 28 bilhões e fazer reformas na Grécia. Na primeira rodada de ajuda do ano passado, a população grega viu o seu governo cortar em 10% o salário de 800.000 funcionários públicos. Isto tudo provocou reações (como perguntava o velho rock da banda Titãs: "Quem quer manter a ordem? Quem quer criar desordem?") que levaram o povo grego a realizar uma radicalizada greve geral de 48 horas. A greve  e os demais protestos partem do conhecimento de que os trabalhadores estão pagando a conta e que, aprovada a proposta do Parlamento Europeu na Grécia, terão que pagar muito mais. Só este ano o Estado grego pretende aumentar a arrecadação de imposto em 2.02 bilhões de euros (o que é muito para o tamanho da economia grega) e no próximo ano o aumento será de 3.68 bilhões de euros. Além disso, o governo fará um drástico corte de despesas nos chamados benefícios sociais. Só a saúde perderá 310 milhões de euros. Além disso, estão impondo ao povo grego a velha receita contra a crise liberal: mais liberalismo com a venda do patrimônio público para alguns empresários, ou seja, as conhecidas privatizações do receituário liberal do velho século XVIII. Primeiro o liberalismo fala em poder absoluto do mercado (a iniciativa privada- dos capitalistas, é claro- deveria agir livremente, pois a mão invisível do mercado conduziria ao bem estar), depois , quando vem a crise, a proposta é vender o patrimônio público a preço de banana e fazer a classe trabalhadora pagar o pato.

Como se percebe, não dá para compartilhar do ponto de vista da referida jornalista, até porque, como já disse, o seu ponto de vista é o dos repressores e do Estado capitalista. O ponto de vista deste blog só pode ser outro. Fico do lado das águas do rio. Elas caminham para o seu destino, por mais que as margens tentem reprimi-las. Como querer a passividade de um povo que vê seu destino ser vendido por parlamentares. Fala-se em governabilidade no ideário neoliberal- começamos a ouvir isto no Brasil desde o governo de FHC-, mas o que é a governabilidade nada mais é do que uma categoria (falsa ideologia mas que produz ações concretas) criada na sociedade capitalista favorecendo a meia dúzia de empresários multinacionais e prejudicando quase a população toda. Fala-se em responsabilidade do Estado nacional e deixa uma nação a mercê de um estado submisso aos interesse estrangeiros. O povo grego vai pagar a conta. Assim como o povo espanhol, o português, o francês... Até porque a classe trabalhadora precisa se reorganizar. Há quase vinte anos atrás caia a União Soviética e o seu sistema político ditatorial. No entanto, ela era a prova viva de que os trabalhadores podem enfrentar e derrotar este sistema caótico que vê no deus-mercado o seu guia e desperdiça as vidas das pessoas. O mesmo sistema que hoje põe em risco a vida no planeta e que vive produzindo guerras como forma de destruir um contingente de pessoas que estariam fora do mercado.

O velho capitalismo está ficando senil. Mas se quer imortal. Anda por aí como um morto-vivo sugando o sangue, os músculos e a alma dos trabalhadores. Devora, o morto-vivo, inclusive a esperança de dias melhores e muitos passam a se conformar com o destino dado pelo deus-mercado. É uma nova forma de conformismo. A igreja medieval produziu o conformismo cristão pregando que se deveria aceitar o destino que teria sido dado por deus. O capitalismo cria uma forma de conformismo mercadológico e democrático. Prega ele que devemos aceitar o destino que o deus-mercado e a santa-democracia estão traçando para nós. Se aceitarmos sofrer (desemprego, fome) um pouco agora encontraremos o céu (seus shoppings) do capitalismo para desfrutarmos. Como diz a velha canção: "pecado, rifa e revista/ o pobre paga é a vista/ a felicidade, o conforto, a alegria e a sorte/ vendeu fiado pra deus / vai receber depois da morte".

O velho capitalismo ainda deve permanecer sugando corpos e almas durante muito tempo. Não porque o seu Estado carcomido dê conta das contradições que este sistema produz. Mas o fato é que a classe trabalhadora precisa retomar suas lutas (o que até certo ponto se tem feito), mas para isso ela precisará produzir novas lideranças, novos intelectuais orgânicos (na linguagem do marxista italiano Gramsci). Sindicatos e partidos políticos, com certeza, ainda são importantes. Mas é preciso se perceber que a esquerda conciliadora (que diz defender os trabalhadores, mas que de fato está a defender os interesses patronais) é um grande empecilho para o desenvolvimento de uma consciência crítica e combativa. A esquerda conciliadora acaba confundindo os trabalhadores. Ela é eleitoreira e mais palatável, por isso recebe votos e em alguns lugares conquista o governo. Aí começa o transformismo (conceito usado por Gramsci para descrever a esquerda que se transformava em direita) e o seu governo acaba também defendendo o empresariado. É isto que vimos , por exemplo, no Brasil de Lula e nas sua política de defesa das grandes montadoras de carros. É o que continuamos a ver no governo de Dilma e de seus em emprétimos bilionários  para as grandes empresas.

A classe trabalhadora talvez consiga gestar bons líderes em um futuro próximo. A luta poderá forjá-los. Por enquanto veremos lutas pontuais contra ditaduras e contra arrochos salariais impostos pelo empresariado mundial. Parece confuso o que estamos assistindo no mundo. Mas estamos diante da velha luta de classes tão bem trabalhada no velho Manifesto Comunista de Marx e Engels. Desde o fim do socialismo real na velha União Soviética o empresariado mundial vem retirando direitos sociais e trabalhistas da classe trabalhadora no mundo. O capital avança sobre as riquezas criadas pela natureza e pelo ser humano. Mas ele não faz isto sem resistência dos explorados. É o que acabamos de ver na Grécia e veremos mais adiante em outros países.
Fevereiro de 2013, e ainda a miséria capitalista na Grécia.
 

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