Amigos e/ou Leitores

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Quintana passarinho, Eles passarão

         
                          Todos estes que aí estão
                  Atravancando o meu caminho,
                                          Eles passarão.
                                          Eu passarinho!


               Há muitos anos, escrevi uns versos e os apresentei para uma antiga amiga chamada Tânia, que  dividia comigo as aulas da licenciatura e o prazer da literatura (ela estava se formando em Português  e eu em Ciências Sociais). Em resposta, ela declamou o poema  a cima feito pelo poeta Mario Quintana. Fiquei fã, desde então, desse poeta do Rio Grande do Sul . Há uns seis anos descobri o músico carioca Lui Coimbra e o seu belo disco  "Ouro e Sol", produzido, segundo alguns, no final dos anos 90. Além de músicas de Capiba, Pedro Luís e Sting, Lui Coimbra nos presenteia com músicas de sua própria autoria. Entre estas estão "Astrologia" e "O idiota desta aldeia", sonetos de Quintana que foram musicados por Lui. Seguem os  poemas e, junto com eles, um outro, que também gosto muito, "Emergência".

                                      Astrologia
                    
                     Minha estrela não é de Belém
                     Aqui parada aguarda o peregrino.
                     Sem importar-se com qualquer destino
                     A minha estrela vai seguindo além...

                     - Meu Deus, o que é que esse menino tem?
                     Já suspeitavam desde eu pequenino.
                     O que eu tenho? É uma estrela em desatino...
                     E nos desentendemos muito bem!

                     E quando tudo parecia a esmo
                     E nesses descaminhos me perdia
                     Encontrei muitas vezes a mim mesmo...

                     Eu temo é uma traição do instinto
                     Que me liberte, por acaso, em dia
                     deste velho e encantado labirinto.



                                      

                                     O Idiota Dessa Aldeia

                    Rechinam meus sapatos rua em fora
                    Tão leve estou que já nem sombra tenho
                    E há tantos anos e de tão longe venho
                    Que nem me lembro de mais nada agora

                   Tinha um surrão todo de pena cheio
                   Um peso enorme para carregar
                   Porém as penas, quando o vento veio
                   Penas que eram, esvoaçaram no ar

                   Todo de Deus me iluminei então
                   Que os Doutores Sutis se escandalizem:
                   "Como é possível sem doutrinação?"

                   Mas entendem-me o céu e as criancinhas
                   E ao ver-me assim num poste, as andorinhas
                   "Olha, é o idiota desta aldeia!", dizem.



                                  Emergência

                   Quem faz um poema abre uma janela.
                   Respira, tu que estás numa cela
                   abafada,
                   esse ar que entra por ela.
                   Por isso é que os poemas tem ritmo
                   - para que possas profundamente respirar.

                   quem faz um poema salva um afogado.

                                               
                                                               ******

                              Mario Quintana entrou  no Labirinto em em 1906 e se libertou dele em 1994 quando, finalmente,  foi traído pelo instinto. Sua herança ainda salva muitos afogados, mesmo que o nosso poeta não tenha o mesmo prestígio dado a outros. Alguns Doutores Sutis não concordam e se escadalizam com a simplicidade de alguns poemas. Há quem diga, inclusive, que a obra de outro poeta, Chico Buarque, é apenas a de  um letrista, pois seus versos não passam de metáforas a serem decifradas.   Nossa! Contudo, Quintana é passarinho e os "Sutis" passarão!
                                Às vezes me parece que para alguns a poesia surgiu após a semana de arte moderna. Métrica , sonetos, rimas tornaram-se palavrões. 
           

2 comentários:

Giovana disse...

Eu , ontem, naquele pequeno tempo que parei para falar com vc escola li esse poema na sua camisa e tb adorei. Inclusive tomei a libertdade de copiar ele e colocar no perfil do meu orkut. Muito legal mesmo....
Sempre gosto de passar por aqui

Mara Lilia disse...

Santa camisa essa hein? kkkk
Também amei o verso quando vi em sua camisa na escola lembra? bjs