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sábado, 16 de outubro de 2010

MESTRES, PASTORES E REBANHOS

"Todo de Deus me iluminei então/ Que os Doutores Sutis se escandalizem: 'Como é possível sem doutrinação?' (...) Mas entendem-me o céu e as criancinhas." (Mario Quintana) 
Ontem, dia 15 de Outubro, foi comemorado no Brasil o dia dos professores (ou dia dos mestres, em uma visão mais ampliada da prática de educar, de ensinar ou coisa semelhante). Professor é aquele que professa, ou seja, que diz publicamente o que acredita. É aquele que se permite a arriscada tarefa, segundo Albert Camus em "A Peste", de dizer que dois mais dois são quatro. Tarefa que parece simples, mas que em alguns momentos da vida política de um país tiram de alguns mestres a liberdade ou a vida.

Quantos professores em um passado recente do Brasil tiveram que fugir do país para se abrigar da possibilidade de prisões e torturas? Alguns tiveram a grata loucura e a coragem de ficar e se opor aos ditadores. Manoel Maurício de Albuquerque foi um destes. Acabou sendo preso, torturado, demitido da universidade e dos cursos particulares, mas professou até a sua morte. Confesso que admiro a sua atitude, mas acho que não teria a sua coragem. Como Serra, FHC e outros, eu ia preferir ganhar a vida como exilado e voltar renomeado. Podendo, inclusive, dizer que fui um professor perseguido pela ditadura e chamar, como o fez o então presidente FHC, os aposentados de vagabundos (claro que ele esqueceu que fora aposentado aos 37 anos de idade e que ao retornar do exílio pode, mas não quis, retomar as atividades docentes, preferiu continuar aposentado- ou seja, preferiu ser...). 

Um mestre não se propõe a ter um rebanho de seguidores, embora é possível que suas ideias e exemplos atraiam um grupo de admiradores que com ele tende a dialogar e crescer até que seja possível a alguns (e quem dera a todos) ultrapassá-lo. Só um ego inflamado pode fazer um mestre querer ter seguidores eternos. O velho Marx dizia sobre aqueles que se declaravam seguidor e marxista que ele, o próprio Marx, não era marxista. Para ele, cabia aos que o admirava ultrapassá-lo. Ele mesmo não se dizia um gigante, pelo contrário, dizia que estava sobre o ombro de outros gigantes e, por isso, podia enxergar mais longe.Alguns de seus mestres, cujas ideias ele incorporou e  ultrapassou, foram o filósofo dialético Hegel e o economista burguês Ricardo.

Assim como Marx, nem todos os mestres são professores de ofício. Quase todos os pais, pelo menos  a maioria, tentam ser mestres de seus filhos e buscam, para isso, utilizar de suas palavras e exemplos para conduzirem suas crianças no caminho do bem. Mas todos querem filhos emancipados e com a possibilidade de fazerem as escolhas para seus futuros, até porque sabem que eles terão que decidir na sua ausência. Alguns pastores religiosos também agem desta maneira: através de seus exemplos e palavras tentam ajudar seus irmãos de crença a se tornarem pessoas que possam crescer a ponto de terem condições de decidirem sobre o que seria melhor para as suas vidas. Esses irmãos de crença são vistos como irmãos e não como crianças seguidoras ou, pior ainda, rebanhos.

Este último termo, rebanho, que ganhou cunho religioso, a princípio é um termo econômico, pois nasceu de uma sociedade cuja base econômica era a criação de ovelhas, a sociedade de pastores. Ovelha, é bom lembrar, seria na velha idade média, um dos animais considerados menos inteligente e, por isso, tinha que ser pastoreado idologicamente pelo clero e controlado fisicamente pelo amigo do clero, ou seja o cão-pastor(a nobreza). Confundia-se o texto bíblico "O senhor é o meu pastor" com "o senhor clero é o meu pastor". Ou ainda: "perante Deus o homem é uma ovelha" com o "perante o senhor clero, sou uma ovelha".

Todos sabemos que na velha idade média, o clero não pregava na tentativa de tornar o seu rebanho emancipado. Assim, os sacerdotes não eram- do meu ponto de vista- realmente mestres. Eram somente domesticadores de gente. O ofício do clero não era sacro (não era sacrifício), era mundano: usava-se a literatura cristã para dominar pessoas e fazê-las seguir um caminho traçado pelas lideranças da Igreja. Não era mais a palavra nem os exemplos o mais importante. A pedagogia principal era a do medo e a do castigo. As habilidades desejadas para os seguidores (o rebanho) eram a submissão, a corveia, o a compra das indulgências, o dízimo, etc.

Como já disse, há pastores hoje (católicos e protestantes) que são mestres. Como os professores dedicados, querem a emancipação daqueles para os quais servem. Isto mesmo: o que pode haver em comum entre professores e pastores é serem ambos servidores e emancipadores de pessoas. No entanto, muitos ainda praticam o velho ofício sacerdotal de arrebanharem fiéis para ditarem suas ações, seus sentimentos e, até mesmo, usurparem as suas cidadanias. Sentem-se no direito de decidirem que tipo de roupa, que tipo de música, que tipo de sexo, que tipo de voto seus seguidores possam ter. Fazem do púlpito palanques, fazem de trechos da Bíblia panfletos políticos, fazem dos fiéis uma multiplicação de seus próprios votos. Fazem de cidadãos cordeiros de grupos políticos.

Além disso, alguns usam da podridão da política e a inserem no espaço que eles chamam de sagrado, o interior do templo. Trazem para dentro deste, cópias montadas de vídeos que, além de negarem o bom senso, espalham a mentira produzidas nestas montagens(1). Aqui o "Ide e pregai" é confundido com o façamos política como quem faz a guerra. Passaram a servir, assumidamente, a dois senhores. Ao pai da mentira e a um partido político. Lutero, Lucas e Pedro devem estar se perguntando se a profecia está se concretizando : "muitos falarão em meu nome".

Creio que um dos fatores para tal iniquidade é o crescimento rápido de Igrejas que acabam formando pastores que ou pouco conhecem do que se propõem a pregar ou que agem mesmo de má fé. Um outro fator é o antigo uso político da boa fé do povo. Mas o triste é que nossas crianças estão sendo também conduzidas por esses homens que nada ou quase tem de mestres. Na semana retrasada resolvi fazer uma enquete em uma sala do sexto ano da escola onde trabalho. Constavam neste dia 24 crianças entre 11 e 12 anos. Perguntei quem tinha ouvido falar que uma candidata a presidente tinha ligação com o satanismo ou o diabo. Dez crianças disseram que sim. Dentre estas, a metade me disse que tinha ouvido isto dentro da igreja que frequenta. A turma ficou agitada com o tema e várias crianças me falaram de mensagens subliminares e que eu deveria procurar vídeos sobre os ILLUMINATS. Procurei e cheguei à triste conclusão: que maldade estão fazendo com as nossas crianças. Como Pelé, no milésimo gol, tive a vontade de chorar e dizer "Salve as nossas criancinhas!". Eles dizem que as estão salvando, eu acho que não. Nossas crianças perderão, desta forma, a possibilidade de se tornarem adultos emancipados (religiosos ou não) e servirão de massa de manobra deste novo tipo de curral eleitoral. Tem pastores vendendo seus rebanhos. Quem dá mais?!

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Segue, retirados do You Tube, dois vídeos. Um contra a politização das igrejas o o outro sobre o problema dos professores em São Paulo. No primeiro vídeo, buscando referência em Lutero e na História,  um futuro  pastor tenta combater as ideias do Pr Paschoal Piragine Jr.(1) dizendo que é necessário separar a Igreja e o Estado. Achei interessante a sua abordagem, que, inclusive, tenta combater o uso de currais eleitorais e defender a cidadania livre de seus irmãos de crença. Mas não concordo, entre muitas coisas,  quando ele diz que só a Igreja pode combater as iniquidades. Na verdade, até a liberdade religiosa é fruto da luta de homens que lutaram pelo Estado laico, como os iluministas europeus e o nosso deputado comunista Jorge Amado, que na Constituição de 1946 defendeu a liberdade religiosa.



O segundo vídeo nos serve para desmitificar a campanha do Sr. Serra no que diz respeito à Educação. Segundo a sua propaganda, os professores paulistas tem um dos maiores salários do país. Na verdade, em termo comparativo, é tão ruim quanto o péssimo salário pago no estado do Rio de Janeiro aos mestres. Em SP um professor recebe cerca de 1800 reais para trabalhar por 40 horas semanais, no RJ cerca de 700 para trabalhar por 16 horas. Ou seja, apesar da propaganda, é muito ruim o salário pago pelo estado mais rico do país aos seus professores. Aqui no Rio, as cidades de Caxias, Angra dos Reis, Nova Iguaçu e até a capital com a sua equipe de Educação tucana, pagam um pouco melhor. Além disso, o vídeo mostra que a propaganda da história dos dois professores em uma sala de aula é outra falácia. Há também o problema da representação sindical como um dos problemas do professorado paulista e, é claro, a má vontade da apresentadora do telejornal com os movimentos grevistas que balançaram SP durante esses quatro anos de arrocho salarial serrista.


 (1) Poderíamos citar aqui diversos pastores que fazem campanhas para diversas candidaturas, inclusive a favor e contra a Dilma e o Serra, mas quero lembrar especialmente o Pr. Paschoal  Piragine JR. presidente da Primeira Igreja Batista de Curitiba. Este pastor me fez lembrar da postagem posta aqui no dia 02 deste mês que falava do canto da ema. Creio que o sr. Piragine Jr é um exemplo claro da "ema" que geme nos "trazendo no seu canto um bocado de azar". Sua fala mansa destila inverdades e uma politização de baixo nível do púlpito religioso. Piragine divulgou em sua igreja um vídeo montado que pode ser visto também no You Tube, mas como o nível é muito baixo preferi não apresentar. Este senhor foi um dos que iniciaram a campanha ilegítima que dizia que há candidatos que defendem o aborto de fetos de até nove meses e outras baboseiras. Diversos pastores se colocaram contra e a favor dele, o que demonstra que as Igrejas estão se tornando aqui, tanto quanto na matriz estadunidense, verdadeiros partidos políticos.
 
Se for de interesse do leitor, segue outro vídeo criticando o Sr Paschoal Piragine. É só clicar no endereço abaixo que será possível entrar no You Tube e lá é possível encontrar outros vídeos sobre esse debate. No You Tube é possível encontrar gravações de diversos pastores usando o púlpito para defender ou o Serra ou a Dilma. A Grande Imprensa, na sua campanha pró-Serra, nos leva a crer que a Sra. Dilma não tem apoio nos meios religiosos, mas é fácil encontrar no You Tube muitos vídeos desmentindo a Grande Imprensa, procure, por exemplo, os seguintes pastores: Izaias de Souza Maciel, João Nunes, Glaycon Terra Pinto, Silva Nunes, Rodovalho e outros.
                                       
                                        


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